
Esses desenhos, em geral, destacam olhos, bocas, sobrancelhas e narizes de maneira bastante exagerada, infantili, aumentado a expressividade dos personagens. Foi esse cara quem introduziu os movimentos nas HQ's através de efeitos gráficos, como linhas que dão a impressão de velocidade, destacando todas as ações que descrevem movimento. A partir daí as histórias dos mangás ficaram mais longas e começaram a ser divididas em capítulos.
Esse tal de Osamu Tezuka tinha até um estúdio próprio e produziu a primeira série de animação (animê) para a TV japonesa: o Astro Boy. Isso em 1963. A partir daí o mangá passou do papel para a televisão e ganhou esse aspecto comercial que lhe é tão característico.
Conheci esse mundo através do meu filho. A geração dele é bem influenciada por esses desenhos japoneses. Na minha época já passava uns enlatados japoneses bem trash como o Ultramen e o Spectramen. Mas hoje, cada série de TV é destinada à uma faixa etária. Não há como escapar. Esses desenhos determinam toda uma forma de consumo que vêm a reboque de um lançamento.
Boa parte das crianças da geração video-game, sejam elas do ocidente ou do oriente, ficaram viciadas nessas séries japinhas que passam na TV: é Pokemon, é Digimon, Yugi-Oh, Naruto, Death Note, Love Hina, One Pice e muitos outros, alimentando todo um consumismo desenfreado no público infantil e teen. Esses desenhos movem uma indústria midiatica que vende de tudo mesmo. É figurinha, é mochila, é camiseta. São milhões de bonecos, joguinhos, cartinhas... E viram temas de festas infantis. É apelativo. Transformam-se em objetos do desejo e movimentam royalties robustos... Quem já teve muitas festinhas infantis para comparecer, sabe que elas têm, todas, a mesma cara, o mesmo formato. O que muda é o tema. Assim, fica parecendo que uma festa é diferente da outra, mas na verdade, elas são absolutamente iguais.

A paixão agora é por uma série chamada To Love Ru. Uma historinha sem pé nem cabeça, da qual ele é fiel devoto. Foi tema da festinha de 12 anos que eu produzi para ele. Desenhos do artista lá de casa. Conta a história de Rito, um garoto de 16 anos, filho de um executivo workaholic e de uma estilista que está sempre viajando a trabalho. Um aluno normal, que gosta de futebol e que tem uma queda por uma menina do seu colégio chamada Haruna. Como vários garotos nessa idade, ele tem dificuldade de conversar com garotas e não consegue declarar o seu interesse por ela.
É aí que acontece uma coisa bem surreal. Surge uma menina nua na sua banheira, chamada Lala Deviluke. Ela é na verdade uma princesa extraterrestre fugitiva que acaba se apaixonando por ele, ficando a melhor amiga da menina que ele gosta - a tal da Haruna - e que prefere ficar na Terra morando com o garoto e sua irmã, já que os pais dos dois estão sempre ausentes mesmo. É, tem um recadinho para os pais nessa historinha. E um conflito triangular na historinha.
Os adolescentes sempre foram o público-alvo do gênero dos mangás, mas eles se diversificaram tanto que acabaram virando um fenômeno cultural e comercial no Japão. Em parte por alcançarem todas as gerações e classes sociais, mas principalmente por serem baratos e acessíveis. Nos anos 60, apareceram os primeiros mangás adultos. Tinham assuntos mais profundos e roteiros mais complexos. E a partir daí surgiram também os mangás eróticos.
Os mangás falam de assuntos triviais como a vida escolar, o trabalho, os esportes, o amor, a guerra, o medo, a economia, a história do Japão... Assim, foram diversificando-se segundo o gosto de cada público e sendo aceitos culturalmente até tornarem-se esse fenômeno de hoje. A leitura única e exclusiva desse gênero, seria bastante questionável, como quase tudo o que é excessivo. Mas não se pode ignorar que eles realmente representam um novo fenômeno cultural. Eu faço a minha parte. Tento estimular e respeitar as mais variadas formas de expressão. E tento entender as novas que me são apresentadas. Sei que vou julgar mesmo. É inerente a mim e ao ser humano. Mas o fato de desconhecer algo, não me impede de enxergá-lo, processá-lo e ter a boa vontade de querer conhecê-lo. Os mangás são uma ponte para o universo particular do meu adolescente.
Uma curiosidade: A ordem de leitura de uma revistinha de mangá é inversa a ordem da ocidental, ou seja, a leitura das páginas é feita da direita para a esquerda. É a maior birutice para os padrões ocidentais. O conteúdo é em preto-e-branco, e, às vezes, têm algumas páginas coloridas, em papel reciclado, o que os tornam baratos e acessíveis. A edição de mangás representa hoje mais de 1/3 da tiragem e mais de 1/4 dos rendimentos do mercado editorial do Japão. Daí se entende o estímulo ao consumo de tudo o que produzem.
