domingo, 17 de maio de 2009

Louise Brooks e a origem de Valentina

Mary Louise Brooks foi a primeira "it girl" do cinema. Do cinema mudo, by the way. Nascida em Kansas, em 1906, foi modelo, dançarina e escritora. Foi liberal, libertária e libertina.

Ela deu vida à trágica e impulsiva personagem Lulu no filme "A Caixa de Pandora", de G. W. Pabst (Alemanha, 1929) que gerou muita polêmica na época, por causa das atitudes de Lulu - uma mulher sexualmente livre. Também foi o primeiro filme a exibir uma cena de lesbianismo no cinema. Imagina isso em 1929! Ano do crash mundial da bolsa de valores e da grande depressão.

O filme foi muito mal recebido nos EUA. Mais tarde seria considerado um clássico e viria a imortalizar Louise Brooks como Lulu. Mas na época, ela acabou ficando mal vista e, de certa forma, colocada numa espécie de "lista negra" pelos grandes estúdios.


Além de considerada arrogante e atrevida, Louise Brooks era extrememente insegura, quase beirando a paranóia e se convenceu de que os estúdios estavam querendo humilhá-la. Desistiu de estrelar um filme com James Cagney, o que poderia ter revitalizado sua carreira cinematográfica, simplesmente porque preferiu ficar com o seu amante. Deixava seu superego de lado ao fazer declarações bombásticas. Não tinha pudores em posar para fotos ousadas ou atuar em filmes controversos para a sua época. E pagou um preço alto por isso. Largou precocemente o cinema em 1938, aos 32 anos de idade.

Nos anos seguintes, começou a escrever e teve diversos artigos publicados em revistas na Inglaterra, na França e no Canadá. Mas só três de seus artigos foram publicados nos EUA, um deles na revista Image, editada pela Eastman House. Assim como Hollywood não tinha sabido o que fazer com Louise, a atriz, a indústria editorial americana também não sabia onde encaixar Louise, a escritora.


Seus filmes com G. W. Pabst foram resgatados por críticos nos anos 50, quando já vivia reclusa em Nova Iorque, longe dos seus tempos de Hollywood. Morreu em 1985, aos 78 anos de idade.

O visual de Louise Brooks inspirou o desenhista italiano Guido Crepax a criar o personagem de quadrinhos eróticos mais famosa das HQ's, a milanesa Valentina.


Valentina Rosselli é uma fotógrafa independente, sexy e bem resolvida que se envolve com o crítico de arte Philip Rembrandt, que na verdade é um super-herói com poderes mediúnicos, com o codinome de Neutron, no melhor estilo 007.

Inicialmente ela era apenas uma coadjuvante nas tramas policiais protagonizadas por Neutron, mas foi aos poucos ganhando espaço e assumindo o papel principal nas histórias.

Criada em Milão, um dos focos do design, moda e comportamento do mundo, Valentina faz inúmeras referências à alta costura, com o seu corte de cabelo Chanel e o seu vestidinho Dior. Ela é linda, esguia e independente. O ambiente natural de Philip Rembrandt e Valentina Rosselli são salões repletos de artistas e intelectuais onde circulavam inúmeras referências literárias, musicais e artísticas da década de 60.

Com o tempo, no lugar dos enredos de trama policial, as histórias de Crepax foram ficando cada vez mais surreais e sensualmente oníricas. Valentina sonhava, nem sempre dormindo, com um mundo surreal, povoado por fantasias eróticas.

A obra de Guido Crepax influenciou toda uma geração de cartunistas como Milo Manara e Paolo Serpieri, mestres no gênero dos quadrinhos eróticos.

"A boca, os olhos e outras partes de Valentina, presentes em cortes e enquadramentos pouco comuns às HQs da época, trouxeram uma atmosfera cinematográfica e particular às histórias que, junto com seu conteúdo surreal, foram responsáveis por conferir ao trabalho de Crepax o status de arte".

Ah! Tem um documentário chamado Lulu in Berlin, no YouTube, que resgata a obra de Louise Brooks através de uma entrevista da atriz em 1974. Mostra uma mulher que apesar da passagem do tempo, permaneceu bela, lúcida e articulada. E exilada.

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